Doce e torturante


Lembro-me daquela tarde com o beijo amigável de Greg dado em minha bochecha e um abraço desconsertado. Logan Park foi o cenário especial para aquelas mudanças tão trágicas.

Ao me receber assim, Greg que havia prometido me amar e zelar por nosso relacionamento acima de qualquer obstáculo, estava sinalizando que algo não iria terminar bem. Porque eu conhecia seus sinais... O seu olhar não se fixava no meu e suas mãos nervosas ora eram entrelaçadas a si, ora eram apoiadas num cruzar de braços.

Horas antes ele havia me mandado um sms curto em tom seco “Encontre-me as três no Logan, no deque dois”. No verão era possível nos encontrar ali sem nos preocupar com os olhares e brincadeiras dos estudantes da Universidade Otago, pois a maioria estava fora e o parque acabava sendo frequentado por moradores e pelos poucos estudantes que não retomavam às suas casas nas férias de julho.

Nós como casal éramos tranquilos, o ciúme era comedido e a confiança, até àquela hora, era nossa principal aliada. E apesar de ser meu primeiro relacionamento sério, eu não me sentia aflita, tampouco insegura por estar com um cara bonito, estudioso, esforçado, integrante da equipe de caiaque nas competições interestaduais e paquerado por todas as meninas do campus. Eu lidava bem com todo aquele assédio e com o tempo aprendi a não me importar com as calouras que morriam de amores por qualquer atleta da universidade. Afinal, homem uniformizado era até excitante, mas Greg deixava claro seu lado romântico e oferecia toda conquista a mim e eu, simplesmente, adorava!

Contudo, aquele sms havia me recordado que os jogos interestaduais retomariam logo que as aulas voltassem, as finais aconteceriam em até duas semanas e um dos atletas da equipe campeã poderia ser convidado a participar da equipe nacional. E a grande dúvida de Greg era que ao final daquele mesmo ano seu curso seria concluído e se a sua equipe fosse campeã, ele estava cotado a ser o integrante a fazer parte da equipe nacional. Desde sempre, eu me preparava para aquele possível término. Porque eu era um ano mais nova que ele e ainda possuía um ano e meio pela frente até concluir a graduação de Letras. E, antes mesmo de terminar, ele já recebia propostas de emprego garantido em outros estados. Esse era o preço que eu pagava por ser apaixonada por ele.

Eu me vesti apressadamente com o primeiro vestido e bolero que vi pela frente e parti. Pois no meu relógio já marcava duas horas e trinta minutos e até eu chegar ao parque e andar até o deque dois já seriam três horas. Quando eu cheguei, o avistei de longe. Vendo-o distante seus cabelos louros reluziam expostos ao sol, sua pele clara contrastava com a roupa que trajava, uma calça capri marrom, a bata que eu havia dado em seu aniversário no mês anterior e um sapatênis; personagem lindo naquela paisagem de beleza díspar. Então eu percorri o deque de madeira, enquanto ele se virou. Se aproximou de mim, beijou-me a maçã do rosto e me deu um semi abraço. Eu o perguntei como estava e ele disse mais para si do que para mim “Poderia estar bem...”. Acabei avistando o barco atracado ao deque e com curiosidade investiguei “Vamos andar?” e apontei para o mesmo. E em resposta ele meneou positivamente e questionou-me se gostaria e repliquei seu gesto.

Ele me ajudou a subir no barco e após algumas remadas solitárias e alguns olhares desviados, ele nos levou a uma distância considerável da margem do lago. Enquanto eu por uma tentativa vã sorria para ele... Aquilo parecia entristecê-lo mais. Até que sem escrúpulos eu lhe indaguei “Porque viemos até aqui, Greg?”. E ele, simplesmente, abaixou a cabeça e me respondeu em tom baixo “Você sabe, não me faça dizê-lo em voz alta, Lily...” Eu queria me fazer de desentendida, mas era tão óbvio. A dor foi pujante e as lágrimas adiantaram-se em me visitar. Os soluços tomaram som e naquele vazio do lago Mapourika pareciam ecoar. Ele se sentou ao meu lado e disse olhando ainda para os próprios pés “Não quero lhe ver chorando, Lily. Lembra-se das nossas conversas?! Você disse a mim que nos verões e invernos até que termine o seu curso, nós seríamos um casal. Hein, Lily.” E com uma das mãos acarinhou meu rosto e fez-me levantá-lo, encarando-o pela primeira vez naqueles últimos minutos. Eu não soube ser forte; não quis sê-lo. Amava-o e não sabia se aquilo bastava para um relacionamento à distância.

Até tentei lutar contra o seu afago, mas ele foi acercando-me com seus braços e beijando meus cabelos, enquanto as lágrimas insistiam em cair. O beijo nos lábios foi inevitável. Em sibilo ele disse o eu te amo mais doce e, quiçá, o mais torturante.

Deitamo-nos no barco e compartilhamos o silêncio. Porque eu queria aspirar seu cheiro, ouvir o ritmo de seu coração e provar do seu gosto para me lembrar quando ele não mais estivesse comigo. Pelo menos quando não estivesse tão próximo de mim.
Pauta para a 139ª semana do Blorkutando! Deixei para fazer última hora... Para quem não escrevia contos como esse e não participava há um tempo de algum projeto, ficou gigante, então desculpa. Volto logo mais!
Beijo pra quem é de beijo.

2 comentários:

  1. O blogger realmente está jogando no time contrário ao meu, faz séculos que estou tentando comentar nos textos daqui e não consigo... Não tento mais, ultima vez...

    Babi, admiro muito a sua maneira de escrever e essa admiração não nasceu ontem, vc a cada dia, tem se tornado uma amiga muito importante e eu adoro ler você e principalmente sentir vc através das palavras que riscas...
    Não sei se você percebeu, mas tem muito dos meus traços interiores nos seus versos, meus sentimentos e afins... Estão aos montes decorando essa sua tela...

    Obrigada por sempre me fazer tão bem através dos seus escritos.
    Eu gostei muito, os detalhes a descrição do cenário estão perfeitos, a gente vê cada pedaço das cenas e consegue senti-las... Gostei mesmo.

    Um Beijo e muito obrigada pela delícia de leitura.

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